quinta-feira, 26 de maio de 2011

ARTISTA CONSIDERA CANCELAMENTO DE EDITAIS DO MINC PREOCUPANTE

Para o representante do Movimento Nacional dos Pontos de Cultura Geo Britto, o cancelamento pelo Ministério da Cultura (MinC) de editais de 2010 para o projeto Ponto de Cultura preocupa os artistas. “Os pontos de cultura não apenas garantem o acesso a cultura como permitem que a própria população mostre a sua arte”, afirmou. Os editais receberam pareceres contrários da Advocacia-Geral da União.

Britto participa de audiência pública da Comissão de Educação e Cultura sobre o do Projeto de Lei 757/11, da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que torna o Cultura Viva um programa permanente do MinC.

Marcha

Ontem, na Câmara, a ministra da Cultura, Ana de Hollanda, recebeu cerca de 260 representantes da Marcha Nacional do Movimento Pontos de Cultura. Vindos de 17 estados, os manifestantes pediram a aprovação do PL 757/11.

Durante a reunião, integrantes da marcha relataram à ministra os problemas que têm enfrentado por conta de atrasos na liberação de verbas. Ana de Hollanda disse apoiar as reivindicações dos representantes dos pontos de cultura, mas afirmou que em relação às liberações orçamentárias é preciso seguir as normas estabelecidas pela Lei das Licitações (8.666/93).

Segundo Geo Britto, a fiscalização dos Pontos de Cultura deve ser diferenciada. “A lei tem que tratar de forma diferenciada os diferentes”, disse, ressaltando que os pontos de cultura não são grandes produtores, mas artistas populares muitas vezes com dificuldades de garantir sua sobrevivência por meio da arte. “Não são os Pontos de Cultura que têm problema com o marco legal; é o marco legal que tem problemas com os Pontos de Cultura”, complementou.

“A desnacionalização da economia no Brasil não encontra paralelo no planeta”

Nesta página, apresentamos aos nossos leitores uma conden- sação da palestra proferida pelo desembargador Pedro Vals Feu Rosa, do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, aos membros da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG). O motivo, naturalmente, é sua justa análise do principal problema que hoje o nosso país enfrenta para encontrar-se firmemente plantado no terreno do desenvolvimento: a desnacionalização da sua econo- mia. Não é, sem dúvida, um problema difícil de superar, principalmente quando a crise dos EUA, Europa e Japão está longe de ter um fim à vista, se devidamente reconhecido como problema - e enfrentado. O principal obstáculo, desde os governos Collor e Fer- nando Henrique - que escancararam o país a essa praga - tem sido puramente ideológico: a concepção de alguns, que projetam sua própria inferioridade no país, de que desnacionalizar é um avanço, de que aquilo que é nacional é atraso, ou, na forma atual, de que a base do crescimento é o capital estrangeiro, vale dizer, o chamado “investimento direto estrangeiro”, que significa meramente a venda de nossas empresas para empresas externas. Como nota o desembargador, jamais houve país que se desenvolvesse com essa base, pela simples razão de que as empresas externas não vêm desenvolvê-lo, mas extrair lucros máximos e enviá-los para suas matrizes. Em suma, essas empresas fazem parte de outras economias, não da nossa, onde são tentáculos dessas outras economias. Sem dúvida, é possível conviver com empresas estran- geiras na economia nacional - o que não é possível, se quisermos nos desenvolver, é que elas determinem a dinâmica da economia, que destruam elos internos da cadeia produtiva em prol de seus próprios elos externos, ou, o que é outra forma de dizer o mesmo, que elas ocupem o papel central em todo e qualquer ramo da nossa economia. Não por acaso, quando o presidente Lula fez do crescimento o foco de seu segundo mandato, recorreu aos investimentos públicos que são o motor do Plano de Aceleração do Cres- cimento (PAC), apesar das vagas de “investimento direto estran- geiro” que invadiam o país desde o governo Fernando Henrique.


(C.L.)

PEDRO VALS FEU ROSA

Dia desses, meio que ao acaso, conversava eu com um amigo sobre um curioso aspecto da História, qual o de iludir as mentes mais desavisadas quanto a fatos ou processos contemporâneos. É realmente curioso verificarmos que, nos momentos mais agudos da história de países ou povos, muitos dos que os viveram sequer se deram conta da importância dos fatos que testemunharam.

Darei um exemplo: a queda do Império Romano. Eis aí um dos momentos cruciais da História. Curiosamente, no entanto, poucos romanos se deram conta disso! Recuso-me a acreditar na cena de alguém chegando em casa e comentando com a esposa: “Maria, acabei de saber ali na praça que o Império Romano acabou”, ou “Maria, já estamos na Idade Média! Acabaram de me falar isso ali na esquina”.

Pelos mesmos motivos, não nos passa pela cabeça que algum arauto, em uma das praças de Florença, tenha anunciado, com a voz solene características das grandes ocasiões, a aurora do Renascimento. E quanto à época das grandes navegações? É inimaginável alguma eventual convocação de marinheiros em termos como “está aberta a temporada das grandes navegações. Aliste-se na Marinha e venha participar deste momento histórico”.

Há também a Revolução Industrial. Seria até pitoresco imaginarmos um inglês daqueles dias comentando com amigos que iria abrir alguma fábrica, pois o governo anunciara no dia anterior o início de uma nova era na História.

Todos estes exemplos nos remetem a uma constatação inevitável: a maioria dos processos históricos, principalmente aqueles que independem de um marco notório, simplesmente passa desapercebida aos olhos dos que os testemunham! Só muito depois, no cotejo com a integralidade da trajetória humana, é que eles ganham certidão de nascimento e batismo!

E é assim que a História, através de uma sua faceta até curiosa e pitoresca, nos ensina sobre a importância de avaliarmos o momento presente sob pontos de vista mais amplos, que englobem não somente o passado mas também o futuro - em uma expressão, que situem o presente com a maior precisão possível dentro dos processos que o tempo enseja. Está aí, perfeito e acabado, o que se exige de um povo que se pretenda vencedor: a sensibilidade que o leve a perceber a intensidade do momento presente, e a sabedoria de orientar-se conforme as lições do passado e as aspirações do futuro.

Estas reflexões, aplicadas ao Brasil, nos permitem concluir, e sem maiores dificuldades, estarmos diante de uma das “encruzilhadas da História”. Sim, o nosso país tem estado, ao longo das gerações contemporâneas, em um momento decisivo - e não temos percebido isso enquanto elite de um país!

Das decisões lançadas sobre os ombros de nossa geração, talvez como em poucas vezes ao longo de nossa História, sairá um Brasil moderno e preparado para os desafios do amanhã, ou então um país enfraquecido e dividido.

[Entre os Brics] Rússia, Índia e China trataram de fortalecer seus respectivos parques industriais e tecnológicos nacionais, enquanto que nós fizemos o oposto, vendendo para estrangeiros algumas de nossas melhores empresas.

Em verdade, o processo de desnacionalização da economia que se promoveu no nosso país, até onde pesquisei, não encontra paralelo no planeta!

Citarei um pequeno exemplo: há coisa de um ou dois anos planejou-se vender uma das maiores empresas privadas da França a um grupo norte-americano - um negócio absolutamente lícito. Mas eis que os Poderes constituídos daquele país, de forma aberta e frontal, anunciaram ser aquela empresa uma joia do país, que não poderia ser vendida, e que tudo fariam para impedir o avanço das negociações. O resultado: a empresa continua francesa, e agora revitalizada.

Em nosso país o processo histórico contemporâneo foi diferente: venda-se! Entregue-se! Nos últimos anos, incríveis 60% das empresas brasileiras negociadas foram parar nas mãos de estrangeiros. Foi assim que chegamos no insólito país cujos habitantes compram o leite de suas próprias vacas, a água mineral de suas próprias nascentes e a maioria dos produtos de sua própria terra de empresas estrangeiras aqui instaladas.

Da indústria alimentícia à mineração, da comunicação à siderurgia, dos transportes à energia, o que o Brasil possuía de melhor foi vendido a grupos estrangeiros. Um país não pode se desenvolver verdadeiramente sob tais condições.

Em verdade, vejo sustentando nossa aparente pujança o remeter para fora, a preços aviltantes, riquezas as mais preciosas que temos, a maioria delas de natureza não-renovável. A conta desta cegueira já começará a ser paga pela próxima geração - no ritmo atual de extrativismo, que só aumenta a cada dia, daqui a 82 anos não teremos mais minério de ferro para exportar. Nosso níquel só durará mais 116 anos, o chumbo 96, o nióbio apenas mais 35 anos, o estanho 80, os diamantes 123 e o ouro míseros 43. Sim, o Brasil da Serra Pelada será importador de ouro daqui a mínimos 43 anos!

Permito-me, concluindo este raciocínio, apontar o exemplo do parque agrícola do sul do Brasil. Éramos grandes e poderosos plantadores e exportadores de soja, trigo etc. E eis que, dentro da nossa macropolítica histórica de internacionalização da economia, abrimos nossas fronteiras aos concorrentes argentinos. Ganharam eles, que praticamente levaram à miséria os agricultores dos estados do sul. A quem disser que “em compensação passamos a exportar mais para lá”, e que graças a isto crescemos, responderia que, após consultar a pauta de nossas exportações, constatei que a maior parte dela é de produtos fabricados por empresas estrangeiras aqui instaladas. Em uma frase: sacrificamos nossa agricultura a troco de enriquecermos empresas estrangeiras. Ouso perguntar: isto é crescimento real, sólido e consistente?

Parece incrível, mas vergonhosamente empresas estrangeiras já são responsáveis por 70% de nossas exportações de soja, 15% das de laranja, 13% de frango, 6,5% de açúcar e álcool e 30% das de café! Isto já sangra o Brasil em mais de US$ 12 bilhões a cada ano só a título de remessa de lucros.

Diante desta vergonha fico a pensar nos grandes vultos que, com sacrifício, nos entregaram o Brasil grande que recebemos se contorcendo em suas tumbas, rubros de indignação e revolta com nossa fraqueza e mediocridade. E fico a temer pela cobrança das gerações seguintes, que estão por receber de nossas mãos um país loteado, retalhado, quase que vendido.

Não se diga, cinicamente, em nossa defesa, que a culpa foi do povo. Jamais. Este está lá, padecendo nas íngremes encostas dos nossos morros, trabalhando de sol a sol, semeando e colhendo quase sempre sem apoio algum. Este povo humilde, se algo der errado, terá sido vítima, jamais culpado. A culpa tem sido, é e será nossa. Nós, autoridades, empresários e formadores de opinião somos os responsáveis.

Aliás, não somos. Fomos. Digo isto porque já não vejo condições de o Brasil sair de uma era que talvez no futuro seja batizada por algum historiador de “Período de Internacionalização”, “Era da Alienação”, ou seja lá o que for, para nosso desdouro.

É fato: sem que tenhamos percebido, acabamos de passar por uma das “encruzilhadas da História”. De toda sorte, uma outra está por vir - aquela prevista pelos estudiosos norte-americanos, que nos colocam a partir de 2020 como grandes exportadores de petróleo e alimentos.

Dado o nosso malogro na “encruzilhada anterior”, já estaremos chegando mal a este novo período de riqueza que se avizinha - será ele, em sua maioria, explorado por empresas transnacionais aqui instaladas. Não por acaso, e cito um pequeno exemplo, há poucos dias negociou-se um campo de petróleo situado próximo ao nosso litoral por robustos US$ 7 bilhões!

Estarei exagerando? Não. Olhem em volta. Vão a uma festa qualquer, seja no quintal de um barraco ou nos mais finos salões, e constatem a verdade simples de que ‘quanto mais bandido, mais aplaudido’.

Nossa sociedade já passa a diferenciar os pequenos corruptos dos grandes - aqueles, “normais”, merecedores até de apoio e voto, e estes apenas do nosso servil e respeitoso cumprimento. Como se isto fosse possível!

Este tem sido, lamentavelmente, um comportamento normal e socialmente aceitável. Respirem fundo, fechem os olhos, isolem-se por alguns momentos que seja da rotina frenética deste início de milênio, e experimentem ver a realidade a partir de um ponto de vista só um pouquinho mais alto.

Percebam com que clareza alguns poucos maus semeiam a desgraça pelo mundo - tudo às claras, sob as vistas de todos. Nós - cada um de nós - sabemos seus nomes e o que fazem. Constatem o quanto perdemos em tempo e qualidade de vida por conta deles. Ouçam os gritos dos miseráveis que sofrem abandonados pelas prisões e corredores de hospitais. Escutem, por um instante que seja, o choro das crianças devoradas por ratos em nossas favelas. Vejam - ou melhor, não vejam - os nossos irmãos soterrados pelos deslizamentos de terra, sobre uma terra tão rica como é a do Brasil. E subitamente Pilatos vai nos parecendo mais e mais familiar, diante dos nossos tenebrosos silêncio e passividade.

Cumprir leis em um país nestas condições é tarefa árdua, quase que impossível. E tanto pior quando este debate tem passado ao largo da vida nacional, quase sempre às voltas com simpósios, congressos e conferências sobre “A Importância da Taturana de Peito Rosado no Carnaval do Casaquistão”, “A Influência do Espirro do Urubu na Formação das Correntes Aéreas” ou outros temas de igual jaez, retrato de uma Sociedade que está a dormitar em berço esplêndido.

Não se entenda, com estas palavras, estar eu a sugerir que de uma hora para outra nos transformemos em um Dom Quixote ou coisa do gênero. Jamais. Somos imperfeitos demais para isso. Nossa tão falha natureza humana, em meio aos percalços da vida, jamais deixará de nos dar momentos de Pilatos. Sim, não podemos nós pregar a perfeição ou atirar pedras. Absolutamente. Em verdade, que o Criador compreenda nossas fraquezas humanas é o que esperamos.

Apenas se espera de nós, em um momento tão sério, no qual está sendo definido o destino do nosso país, que, inspirados na divisa de Barroso, cumpramos com o nosso dever. E não temos muito tempo para isso - em mais uma ou duas décadas também este processo histórico estará encerrado, e o Brasil terá ido rumo a um futuro de desigualdade, conflitos sociais e talvez até cisão, ou para um outro de ordem e respeito básico às leis que o conduzirá a uma era de estabilidade e progresso duradouros.

Esta a lição que nos lega a história: um povo corretamente esclarecido é um povo unido, cujo país dificilmente será vencido!

Os meios para isso, a universalização das telecomunicações nos proporciona a cada dia com maior intensidade. É hora, assim, de que cada um de nós vá às ruas, criticar o que tem que ser criticado e defender o que tem que ser defendido. Nossos conhecimentos e recursos já não podem ficar restritos, pois sério o momento presente.

Estejamos, pois, à altura das exigências do momento histórico de nosso país e de suas instituições. Este o chamado da Pátria. Este o nosso dever.

Sou um otimista. Acredito no Brasil. Tenho orgulho do meu país. Quero vê-lo grande. Acima de tudo, quero entregá-lo à próxima geração do mesmo tamanho que este tinha quando me foi confiado. Posso ser apenas um, e insignificante. Mas o Brasil, lutando um novo “Riachuelo” contra o atraso, a miséria e, ouso asseverar, a segregação, espera que cada um cumpra com o seu dever – até mesmo os mais insignificantes.

Seja o maior de nossos receios não a dor do descobrir ou do discutir a verdade, ou mesmo do ser perseguido por causa dela, mas, antes, temamos o julgamento de nossas consciências e a posteridade, dedo acusador em riste, a indagar os motivos de uma timidez que tantos bichos desprotegeu,
“Bichos como o que vi ontem,
Na imundície do pátio,
Catando comida entre os detritos.
Quando encontrava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava.
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
O bicho não era um gato,
O bicho não era um rato.
O bicho, meu Deus,
Era um homem”
(Manuel Bandeira)

Muito obrigado.