terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Deixa Falar: folia em prol da cultura popular


Os Pássaros Juninos são uma expressão cultural genuinamente popular, que consome um ano inteiro de trabalho para levar às ruas adereços coloridos e histórias melodramáticas carregadas de imaginação. Essa opereta paraense envolve várias linguagens artísticas, como música, teatro, dança e literatura. Com tantas similaridades com o carnaval, nada mais perfeito para um tema de escola de samba.

Foi o que achou o Grêmio Recreativo Cultural e Carnavalesco Deixa Falar, do bairro da Cidade Velha, que escolheu os Pássaros Juninos como enredo para este ano. O ponto de partida foi a campanha para a reconstrução e o tombamento do Teatro São Cristóvão. Assim nasceu o samba “Ópera de São João, Pássaros de Cordão”.

“Foi um tema difícil”, conta Bosco Guimarães, um dos co-autores do samba-enredo. “Como é uma história rica em detalhes, que começa há mais de 200 anos, foi um desafio resumir tudo isso em apenas algumas linhas. Além disso, é um assunto imerso em polêmica, porque tanto o Teatro [São Cristóvão] quanto os Pássaros Juninos sofrem com o descaso das autoridades”, diz ele.

Fruto da época da Belle Époque, o Pássaro Junino nasceu como uma reinterpretação popular das grandes óperas apresentadas pelas companhias europeias no Theatro da Paz. Sua história também está ligada ao Teatro São Cristóvão, que hoje encontra-se abandonado. Erguido nos anos 1930 e fechado há mais de uma década, o antigo casarão, localizado em frente ao Parque da Residência, ficou conhecido como “Teatro de Pássaros”, por ter servido durante muito tempo como palco para a apresentação dos Pássaros Juninos.

“O enredo vem saudando esses dois ícones do patrimônio cultural paraense”, diz Antônio Ferreira, diretor de Comunicação da Deixa Falar e mestre de cultura do Pássaro Tem-Tem. Ele explica que existe um movimento para que o Pássaro Junino seja considerado patrimônio imaterial não só do Estado, mas do Brasil.

A agremiação vai abrir o desfile mostrando as origens dos Cordões de Pássaro, a partir do ponto de vista dos empregados do Theatro da Paz que assistiam às apresentações. Em seguida, virão as primeiras reencenações desses espetáculos pela cultura popular, quando foram incorporados pelas quadras juninas. O desfile será encerrado mostrando a luta dos Cordões de Pássaro para preservar esse patrimônio

imaterial.

ENGAJAMENTO

Graças ao enredo, a agremiação soma forças ao Movimento em Prol do Teatro São Cristóvão, que chama a atenção da sociedade civil e do poder público para a importância dos Pássaros Juninos.

“O descaso das autoridades está deixando as tradições culturais se acabarem aos poucos, seja o Pássaro Junino, seja o carnaval de rua”, diz Antônio, mostrando assim que as similaridades entre os Pássaros e o carnaval são maiores do que se imagina.

Recentemente, o Governo do Estado sancionou uma lei que torna o Pássaro Junino um patrimônio cultural de natureza imaterial do Estado, considerando que esta é uma das mais tradicionais e criativas manifestações da cultura popular paraense. Num recente levantamento realizado pelo Instituto de Artes do Pará (IAP), foram identificados 18 grupos em atividade na Região Metropolitana de Belém, além de grupos presentes em Itaituba, Santarém e na Ilha do Marajó. Já o Teatro São Cristóvão espera pelo processo de tombamento pelo Instituto de Patrimônio Histórico Nacional (Iphan).

EM NÚMEROS

A Deixa Falar vai para a Aldeia Amazônica com 1.800

brincantes divididos em nove alas, seguidos por dois carros alegóricos, além de três casais de mestre-sala e porta-bandeira e a bateria composta por 140 ritmistas.